domingo, 3 de abril de 2011

"NÃO É O MEDO DA LOUCURA QUE VAI NOS OBRIGAR A HASTEAR A MEIO-PAU A BANDEIRA DA IMAGINAÇÃO"




"SEGREDOS DA ARTE MÁGICA SURREALISTA

Composição surrealista escrita, ou primeiro e último jato

Mande trazer com que escrever, quando já estiver colocado no lugar mais confortável possível para concentração do seu espírito sobre si mesmo. Ponha-se no estado mais passivo ou receptivo, dos talentos de todos os outros. Pense que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a tudo. Escreva depressa, sem assunto preconcebido, bastante depressa para não reprimir, e para fugir à tentação de se reler. A primeira frase vem por si, tanto é verdade que a cada segundo há uma frase estranha ao nosso pensamento consciente pedindo para ser exteriorizada. É bastante difícil decidir sobre a frase seguinte: ela participa, sem dúvida, a um só tempo, de nossa atividade consciente e da outra, admitindo-se que o fato de haver escrito a primeira supõe um mínimo de percepção. Isto não lhe importa, aliás; é aí que reside, em maior parte, o interesse do jogo surrealista. A verdade é que a pontuação se opõe, sem dúvida, à continuidade absoluta do vazamento que nos interessa, se bem que ela pareça tão necessária quanto a distribuição dos nós numa corda vibrante. Continue enquanto lhe apraz. Confie no caráter inesgotável do murmúrio. Se o silêncio ameaça cair, por uma falta da inatenção, digamos, que o leve a cometer um pequeno erro, não hesite em cortar uma linha muito clara. Após uma palavra cuja origem lhe pareça suspeita, ponha uma letra qualquer, a letra “l”, por exemplo, sempre a letra “l”, restabeleça o arbitrário, impondo esta letra como inicial à palavra que vem a seguir."
E aí, quem se aventura a tentar?

A provocação acima foi extraída do "Manifesto do Surrealismo", escrito por André Breton, em 1924. Seguem alguns trechos desse importante texto:

"Tamanha é a crença na vida, no que a vida tem de mais precário, bem entendido, a vida real, que afinal esta crença se perde. O homem, esse sonhador definitivo, cada dia mais desgostoso com seu destino, a custo repara nos objetos de seu uso habitual, e que lhe vieram por sua displicência, ou quase sempre por seu esforço, pois ele aceitou trabalhar, ou pelo menos, não lhe repugnou tomar sua decisão (o que ele chama decisão!). Bem modesto é agora o seu quinhão: sabe as mulheres que possuiu, as ridículas aventuras em que se meteu; sua riqueza ou sua pobreza para ele não valem nada, quanto a isso, continua recém-nascido, e quanto à aprovação de sua consciência moral, admito que lhe é indiferente. SE conservar alguma lucidez, não poderá senão recordar-se de sua infância, que lhe parecerá repleta de encantos, por mais massacrada que tenha sido com o desvelo dos ensinantes. Aí, a ausência de qualquer rigorismo conhecido lhe dá a perspectiva de levar diversas vidas ao mesmo tempo; ele se agarra a essa ilusão; só quer conhecer a facilidade momentânea, extrema, de todas as coisas. Todas as manhãs, crianças saem de casa sem inquietação. Está tudo perto, as piores condições materiais são excelentes. Os bosques são claros ou escuros, nunca se vai dormir.

Mas é verdade que não se pode ir tão longe, não é uma questão de distância apenas. Acumulam-se as ameaças, desiste-se, abandona-se uma parte da posição a conquistar. Esta imaginação que não admitia limites, agora só se lhe permite atuar segundo as leis de uma utilidade arbitrária; ela é incapaz de assumir por muito tempo esse papel inferior, e quando chega ao vigésimo ano prefere, em geral, abandonar o homem ao seu destino sem luz.

Procure ele mais tarde, daqui e dali, refazer-se por sentir que pouco a pouco lhe faltam razões para viver, incapaz como ficou de enfrentar uma situação excepcional, como seja o amor, ele muito dificilmente o conseguirá. É que ele doravante pertence, de corpo e alma, a uma necessidade prática imperativa, que não permite ser desconsiderada. Faltará amplidão a seus gostos, envergadura a suas idéias. De tudo que lhe acontece e pode lhe acontecer, ele só vai reter o que for ligação deste evento com uma porção de eventos parecidos, nos quais não toma parte, eventos perdidos. Que digo, ele fará sua avaliação em relação a um desses acontecimentos, menos aflitivo que os outros, em suas conseqüências. Ele não descobrirá aí, sob pretexto algum, sua salvação.

Imaginação querida, o que sobretudo amo em ti é não perdoares.

Só o que me exalta ainda é a única palavra, liberdade. Eu a considero apropriada para manter, indefinidamente, o velho fanatismo humano. Atende, sem dúvida, à minha única aspiração legítima. Entre tantos infortúnios por nós herdados, deve-se admitir que a maior liberdade de espírito nos foi concedida. Devemos cuidar de não fazer mau uso dela. Reduzir a imaginação à servidão, fosse mesmo o caso de ganhar o que vulgarmente se chama a felicidade, é rejeitar o que haja, no fundo de si, de suprema justiça. Só a imaginação me dá contas do que pode ser, e é bastante para suspender por um instante a interdição terrível; é bastante também para que eu me entregue a ela, sem receio de me enganar ( como se fosse possível enganar-se mais ainda ). Onde começa ela a ficar nociva, e onde se detém a confiança do espírito? Para o espírito, a possibilidade de errar não é, antes, a contingência do bem?

Fica a loucura. “a loucura que é encarcerada”, como já se disse bem. Essa ou a outra.. Todos sabem, com efeito, que os loucos não devem sua internação senão a um reduzido número de atos legalmente repreensíveis, e que, não houvesse estes atos, sua liberdade ( o que se vê de sua liberdade ) não poderia ser ameaçada. Que eles sejam, numa certa medida, vítimas de sua imaginação, concordo com isso, no sentido de que ela os impele à inobservância de certas regras, fora das quais o gênero se sente visado, o que cada um é pago para saber. Mas a profunda indiferença de que dão provas em relação às críticas que lhe fazemos, até mesmo quanto aos castigos que lhes são impostos, permite supor que eles colhem grande reconforto em sua imaginação e apreciam seu delírio o bastante para suportar que só para eles seja válido. E, de fato, alucinações, ilusões, etc. são fonte de gozo nada desprezível. A mais bem ordenada sensualidade encontra aí sua parte, e eu sei que passaria muitas noites a amansar essa mão bonita nas últimas páginas do livro. A Inteligência de Taine, se dedica a singulares malefícios. As confidências dos loucos, passaria minha vida a provoca-las. São pessoas de escrupulosa honestidade, cuja inocência só tem a minha como igual. Foi preciso Colombo partir com loucos para descobrir a América. E vejam como essa loucura cresceu, e durou.

Não é o medo da loucura que nos vai obrigar a hastear a meio-pau a bandeira da imaginação.

O processo da atitude realista deve ser instruído, após o processo da atitude materialista. Esta, aliás, mais poética que a precedente, implica da parte do homem um orgulho sem dúvida monstruoso, mas não uma nova e mais completa deposição. Convém nela ver, antes de tudo, uma feliz reação contra algumas tendências derrisórias do espiritualismo. Enfim, ela não é incompatível com uma certa elevação de pensamento.

Ao contrário, a atitude realista, inspirada no positivismo, de São Tomás a Anatole France, parece-me hostil a todo impulso de liberação intelectual e moral. Tenho-lhe horror, por ser feita de mediocridade, ódio e insípida presunção. É ela a geradora hoje em dia desses livros ridículos, dessas peças insultuosas. Fortifica-se incessantemente nos jornais , e põe em xeque a ciência, a arte, ao aplicar-se em bajular a opinião nos seus critérios mais baixos; a clareza vizinha da tolice, a vida dos cães.

(…)


Se um cacho de uvas não tem duas sementes iguais, como querem que lhes descreva este bago pelo outro, por todos os outros, que dele faça um bago bom para comer? Esta intratável mania de reduzir o desconhecido ao conhecido, ao classificável, embala os cérebros. O desejo de análise prevalece sobre os sentimentos. Disso resultam dilatadas exposições cuja força persuasiva reside na sua própria singularidade, e que iludem o leitor pelo recurso a um vocabulário abstrato, bastante mal definido, aliás.

(…)


Ainda vivemos sob o império da lógica, eis aí, bem entendido, onde eu queria chegar. Mas os procedimentos lógicos, em nossos dias, só se aplicam à resolução de problemas secundários. O racionalismo absoluto que continua em moda não permite considerar senão fatos dependendo estreitamente de nossa experiência. Os fins lógicos, ao contrário, nos escapam. Inútil acrescentar que à própria experiência foram impostos limites. Ela circula num gradeado de onde é cada vez mais difícil faze-la sair. Ela se apóia, também ela, na utilidade imediata, e é guardada pelo bom senso. A pretexto de civilização e de progresso conseguiu-se banir do espírito tudo que se pode tachar, com ou sem razão, de superstição, de quimera; a proscrever todo modo de busca da verdade, não conforme ao uso comum. Ao que parece, foi um puro acaso que recentemente trouxe à luz uma parte do mundo intelectual, a meu ver, a mais importante, e da qual se afetava não querer saber. Agradeça-se a isso às descobertas de Freud. Com a fé nestas descobertas desenha-se afinal uma corrente de opinião, graças à qual o explorador humano poderá levar mais longe suas investigações, pois que autorizado a não ter só em conta as realidades sumárias. Talvez esteja a imaginação a ponto de retomar seus direitos. Se as profundezas de nosso espírito escondem estranhas forças capazes de aumentar as da superfície, ou contra elas lutar vitoriosamente, há todo interesse em captá-las, capta-las primeiro, para submete-las depois, se for o caso, ao controle de nossa razão. Os próprios analistas só têm a ganhar com isso. Mas é importante observar que nenhum meio está a priori designado para conduzir este empreendimento, que até segunda ordem pode ser também considerado como sendo da alçada dos poetas, tanto como dos sábios, e o seu sucesso não depende das vias mais ou menos caprichosas a serem seguidas.


(…)


O homem põe e dispõe. Depende dele só pertencer-se por inteiro, isto é, manter em estado anárquico o bando cada vez mais medonho de seus desejos. A poesia ensina-lhe isso. Traz nela a perfeita compensação das misérias que padecemos. Ela pode ser também uma ordenadora, bastando que ao golpe de uma decepção menos íntima se tenha a idéia de tomá-la ao trágico. Venha o tempo quando ela decrete o fim do dinheiro e parta, única, o pão do céu para a terra!


(…)


Certa noite então, antes de adormecer, percebi, nitidamente articulada a ponto de ser impossível mudar-lhe uma palavra, mas bem separada do ruído de qualquer voz, uma frase bem bizarra que me alcançava sem trazer indício dos acontecimentos aos quais, segundo o testemunho de minha consciência, eu estava preso, nessa ocasião, frase que me pareceu insistente, frase, se posso ousar, que batia na vidraça. Rapidamente tive a sua noção, e já me dispunha a passar adiante quando o seu caráter orgânico me reteve. Na verdade, esta frase me espantava; infelizmente não a guardei até hoje, era algo como: “Há um homem cortado em dois pela janela”, mas não poderia haver ambigüidade, acompanhada como estava pela fraca representação visual de um homem andando, e seccionado a meia altura por uma janela perpendicular ao eixo de seu corpo. Fora de dúvida era a simples aprumação no espaço de um homem debruçado à janela. Mas esta janela tendo seguido o deslocamento do homem vi que se tratava de uma imagem de tipo bastante raro e logo pensei em incorporá-la a meu material de construção poética. Assim que lhe concedi este crédito ela deu lugar a uma sucessão quase ininterrupta de frases que não me surpreenderam menos e me deixaram sob a impressão de uma tal gratuidade que me pareceu ilusório o império que até então eu mantinha sobre mim mesmo, e só pensei então em liquidar a interminável disputa travada em mim (Knut Hamsun põe na dependência da fome este tipo de revelação que me assaltou, e talvez não esteja ele errado (o fato é que nessa época eu não comia todos os dias). Com toda certeza são de fato as mesmas manifestações que ele relata nestes termos:

“No dia seguinte acordei cedo. Estava ainda escuro. Meus olhos estavam abertos fazia tempo, quando ouvi o relógio do apartamento inferior bater cinco horas. Quis novamente dormir mas não consegui, eu estava completamente desperto e mil coisas baralhavam na minha cabeça. De repente me vieram uns bons trechos, próprios para utilização num esboço, num folhetim; subitamente, por acaso, achei frases muito bonitas, frases como jamais escreverei. Eu as repetia lentamente, palavra por palavra, eram excelentes. E vinham mais outras. Levantei-me, peguei lápis e papel na mesa atrás de minha cama. É como se eu tivesse rompido uma veia, uma palavra seguia outra, colocava-se em seu lugar, surgiam as réplicas, em meu cérebro, eu gozava profundamente. Os pensamentos me vinham tão rapidamente e fluíam tão abundantemente que eu perdia uma porção de detalhes delicados, porque meu lápis não podia andar tão depressa, e entretanto eu me apressava, a mão sempre em movimento, eu não perdia um minuto. As frases continuavam a brotar em mim, eu estava prenhe de meu assunto”.

Apollinaire afirmava que os primeiros quadros de Chirico haviam sido pintados sob a influência de distúrbios cenestésicos (enxaquecas, cólicas)
.

Tão ocupado estava eu com Freud nessa época, e familiarizado com os seus métodos de exame que eu tivera alguma ocasião de praticar em doentes durante a guerra, que decidi obter de mim o que se procura obter deles, a saber, um monólogo de fluência tão rápida quanto possível sobre o qual o espírito crítico do sujeito não emita nenhum julgamento, que não seja, portanto, embaraçado com nenhuma reticência, e que seja tão exatamente quanto possível o pensamento falado. Parecia-me, ainda me parece – a maneira como me chegara a frase do homem seccionado o comprovava – que a velocidade do pensamento não é superior à da palavra e que ele não desafia forçadamente a língua, nem mesmo a caneta que corre. Foi com estas disposições que Philippe Soupault, a quem eu comunicara estas primeiras conclusões, e eu começamos a escrevinhar, pouco nos importando com o que pudesse suceder literariamente. A facilidade de realização fez o resto.


No fim do primeiro dia podíamos ler umas cinqüenta páginas obtidas por este meio, e começar a comparação de nossos resultados. No conjunto, os de Soupault e os meus mostravam notável analogia: mesmo vício de construção, falhas similares, mas também, de cada lado, a ilusão de um estro maravilhoso, muita emoção, escolha considerável de imagens de uma tal qualidade que não teríamos sido capazes de preparar uma só delas, mesmo com muito empenho, um pitoresco muito especial, e de um lado e de outro, alguma proposição de pungente burlesco. As únicas diferenças entre nossos dois textos me pareceram corresponder essencialmente a nossos temperamentos recíprocos, o de Soupault menos estático que o meu, e se ele me permite esta leve crítica, ao fato de Ter ele cometido o erro de distribuir, ao alto de certas páginas, e sem dúvida por espírito de mistificação, algumas palavras à guisa de títulos. Em compensação, devo-lhe a justiça de dizer que ele se opôs sempre, com toda energia, a qualquer retoque, à mínima correção ao curso de toda passagem desse gênero que me parecia até descabida. Tinha ele toda razão nisso. É com efeito muito difícil apreciar em seu justo valor os diversos elementos presentes, diga-se mesmo, é impossível apreciá-los numa primeira leitura. A vós que escreveis, estes elementos, na aparência, vos são tão estranhos quanto a outro qualquer, e naturalmente desconfiais. Falando poeticamente, eles se reconhecem sobretudo por um alto grau de absurdidade imediata, sendo o próprio desta absurdidade, num exame mais aprofundado, dar lugar a tudo que há de admissível, de legítimo no mundo: a divulgação de certo número de propriedades e de fatos não menos objetivos, em suma, que os outros.

Em homenagem a Guillaume Apollinaire, que morrera há pouco, e que por diversas vezes nos parecia ter obedecido a um arrebatamento desse gênero, sem entretanto ter aí sacrificado medíocres meios literários, Soupault e eu designamos com o nome de SURREALISMO o novo modo de expressão pura, agora à nossa disposição, e com o qual estávamos impacientes para beneficiar nossos amigos. Creio não ser mais necessário, hoje, repisar esta palavra, e que a acepção em que a tomamos acabou por prevalecer sobre a acepção apollinairiana. Ainda com maior razão poderíamos ter-nos apossado da palavra SUPERNATURALISMO, empregada por Gerard de Nerval na dedicatória de Filles de Feu. Com efeito, parece que Nerval possuiu às mil maravilhas o espírito ao qual recorremos, enquanto Apollinaire não possuía senão a letra, ainda imperfeita, do surrealismo, tendo sido incapaz de lhe traçar um esboço teórico que valha a pena. Eis duas frases de Nerval que acerca disso me parecem bem significativas:

Vou explicar-lhe, meu caro Dumas, o fenômeno que você citou acima. Como você sabe, há certos contistas que não podem inventar sem se identificarem aos personagens de sua imaginação. Você sabe com que convicção nosso velho amigo Nodier narrava como ele tivera a desgraça de ser guilhotinado na época da Revolução; ficava-se de tal modo persuadido que se ficava querendo saber como ele conseguira recolocar sua cabeça.

... E já que você teve a imprudência de citar um soneto composto neste estado de devaneio onírico SUPERNATURALISTA, como diriam os alemães, vai ouvi-los todos. Não são nada mais obscuros do que a metafísica de Hegel ou as MEMORÁVEIS de Swedenborg, e perderiam encanto se fossem explicados, se a coisa fosse possível, conceda-me ao menos o mérito da expressão...

Só com muita fé poderiam nos contestar o direito de empregar a palavra SURREALISMO no sentido muito particular em que o entendemos, pois está claro que antes de nós esta palavra não obteve êxito. Defino-a pois uma vez por todas.

SURREALISMO, s.m. Automatismo psíquico puro pelo qual se propõe exprimir, seja verbalmente, seja por escrito, seja de qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do pensamento, na ausência de todo controle exercido pela razão, fora de toda preocupação estética ou moral.


ENCICL. Filos. O Surrealismo repousa sobre a crença na realidade superior de certas formas de associações desprezadas antes dele, na onipotência do sonho, no desempenho desinteressado do pensamento. Tende a demolir definitivamente todos os outros mecanismos psíquicos, e a se substituir a eles na resolução dos principais problemas da vida. Deram testemunho de SURREALISMO ABSOLUTO os srs. Aragon, Baron, Boiffard, Breton, Carrive, Crevel, Delteil, Desnos, Eluard, Gerard, Limbour, Malkine, Morise, Naville, Noll, Péret, Picon, Soupault, Vitrac.


(…)


É até mesmo permitido intitular POEMA o que se obtém pela agregação tão gratuita quanto possível (observemos, faz favor, a sintaxe) de títulos e fragmentos de títulos recortados dos jornais:

POEMA

Uma risada

de safira na ilha de Ceilão

As mais belas palhas

Têm a cor esmaecida

Na prisão

Numa fazenda isolada

NO DIA-A-DIA

agrava-se

O agradável

Um caminho carroçável

vos conduz ao desconhecido

O Café

roga por si mesmo

O ARTESÃO QUOTIDIANO DE VOSSA BELEZA

Senhora,

um par

de meias de seda

não é

Um salto no vazio

UM CERVO

Antes de tudo o amor

Tudo poderia acabar tão bem

Paris é uma grande aldeia

Vigial

o fogo incubado

a oração

Sabei que

os raios ultravioleta

terminaram seu trabalho

bom e rápido

O PRIMEIRO JORNAL BRANCO

DO ACASO

Vermelho será

O cantor errante

ONDE ESTARÁ?

na memória

em sua casa

NO BAILE DOS ARDENTES

Faço

dançando

O que se fez, o que se fará


O surrealismo, tal como o encaro, declara bastante o nosso não-conformismo absoluto para que possa ser discutido trazê-lo, no processo do mundo real., como testemunho de defesa. Ao contrário, ele só pode justificar o estado completo de distração da mulher em Kant, a distração das “uvas” em Pasteur, a distração dos veículos em Curie são a esse respeito profundamente sintomáticos. Este mundo só relativamente está à altura do pensamento, e os incidentes deste gênero são apenas os episódios até aqui mais marcantes de uma guerra de independência, da qual tenho o orgulho de participar. O surrealismo é o “raio invisível” que um dia nos fará vencer os nossos adversários. “Não tremes mais, carcaça.” Neste verão as rosas são azuis, a madeira é de vidro. A terra envolta em seu verdor me faz tão pouco afeito quanto um fantasma. VIVER E DEIXAR DE VIVER É QUE SÃO SOLUÇÕES IMAGINÁRIAS. A EXISTÊNCIA ESTÁ EM OUTRO LUGAR."

Quadro: Haven - Vladimir Kush

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